Quando Einstein desenvolveu a relatividade geral, ele propôs 3 testes
dela:
- deflexão de um feixe de luz por um campo gravitacional: isto foi comprovado
pela observação de estrelas durante o eclipse de 1919 e posteriormente
com outros eclipses e outros tipos de observações (ver por exemplo
a lista 11).
- Desvio gravitacional da frequência de um feixe de luz num campo gravitacional:
isto foi comprovado pela experiência de Pound e Rebka na torre de
Harvard em 1960. Como frequência é o inverso do tempo, a marcha de
um relógio é afetada por um campo gravitacional e isto foi testado
colocando-se relógios em um avião.
- Precessão do periélio de mercúrio: havia uma pequena discrepância
entre a precessão calculada pela mecânica newtoniana e a precessão
observada,
por século. Quando Einstein calculou
o valor desta precessão usando a relatividade geral, ele encontrou
quase
. Quando ele percebeu que este resultado era uma consequência
natural da sua teoria, sem nenhuma hipótese adicional, Einstein ficou
extremamente feliz. Abraham Pais, físico e biógrafo de Einstein,
em ``Sutil é o Senhor'' escreve que: ``esta descoberta foi,
eu acredito, a experiência emocional mais forte da vida científica
de Einstein, talvez de toda a sua vida. A natureza tinha falado com
ele''.
Vamos analisar um pouco mais afundo este terceiro item. De acordo
com a mecânica newtoniana, as órbitas dos planetas deveriam ser elipses
fechadas, com o sol situado em um dos focos e os eixos apontando sempre
as mesmas direções do espaço. Na prática, porém, a elipse não fica
no mesmo lugar o tempo todo. Em particular, o ponto de máxima aproximação
ao Sol (periélio) muda de localização.
Nessa
animiação, do
site pode-se ver isso melhor.
Essa precessão é de 574''/século. Boa porte dela pode ser explicada
pelas perturbações devido aos outros planetas. Porém, sobra 43''/século
que não é explicada. Acreditou-se que isso seria devido a um planeta
desconhecido, ``Vulcan'', (Afinal, é dessa forma que a existência
de Neptuno fora prevista para entender o movimento de Urano). Esse
planeta nunca foi descoberto e foi somente com a publicação do trabalho
de Einstein que esse mistério teve fim.
Para entender o papel da relatividade geral, vamos começar esboçando
aqui a solução clássica do problema do movimento de uma partícula
teste no campo gravitacional de outra partícula muito massiva. Acharemos,
e Newton mostrou, que as órbitas possíveis são: elipse, hipérbola
e parábola.
Consideremos duas massas
e
nas posições
e
.
A força em
devido a
é:
Esta equação depende de
e
, mas
,
daí segue que:
de modo que podemos reescrever a equação do movimento como:
onde
A vantagem é que a nova equação (1) só depende de
.
Quando
, temos
e
,
daí a equação (1) representa o movimento do corpo 2 ao redor do corpo
1.
Queremos agora resolver a equação (1). O momento angular de
é
, de modo que
ou seja, o momento angular é constante. Como
é por definição
perpendicular a
, este tem que se manter num plano perpendicular
a
. Em outras palavras, a partícula se move num plano e
só precisamos de duas coordenadas para descrever seu movimento
depende só de
e
, coordenadas polares. Com isto, nossa
equação (1) se escreve:
Tomando o produto escalar desta equação com
,
,
que na verdade indica a conservação de
. Tomando o produto
escalar desta mesma equação com
, obtemos:
Queremos achar a órbita
em função de
. Introduzindo a
variável
a equação acima se reduz à equação de Binet:
Esta equação tem como solução:
com
e
constantes. Definindo
e
, temos:
Esta solução é a equação polar de uma seção cônica onde
determina
a escala,
a excentricidade e
a orientação em relação
ao eixo
. Temos:
Pode-se mostrar que os casos acima correspondem respectivamente a
,
e
onde
é a energia de
.
Observações:
- Conforme já explicado, a presença de outros corpos afeta a órbita.
- A fórmula clássica do desvio da luz (ou espalhamento Rutherford),
que vimos ao discutir a deflexão da luz por uma massa:
é uma outra maneira de escrever nossa solução
para
e
(hipérbole).
Na relatividade geral, devido a curvatura do espaço, a equação para
é:
Este resultado difere do caso clássico pelo último termo da direita,
que é pequeno para Mercúrio. Neste caso a solução é (se
):
onde
, daí
Eeste resultado bate com o caso elástico quando
. Com
as correções da relatividade geral o planeta tem como órbita uma elipse
mas o eixo desta gira de
entre 2 pontos de aproximação
máxima (veja a primeira figura desta seção). Pode-se mostrar que a
precessão do periélio por revolução é:
onde
é o semi eixo-maior e
o período. Para Mercúrio, isto
leva a precessão do periélio durante um século de aproximadamente
43'', como anunciado acima.
Ronaldo Carlotto Batista
2006-06-22